16 de dezembro de 2010

Um cão apenas, crônica de Cecília Meireles


Subidos, de ânimo leve e descansado passo, os quarenta degraus do jardim – plantas em flor, de cada lado; borboletas incertas; salpicos de luz no granito eis-me no patamar. E a meus pés, no áspero capacho de coco, à frescura da cal do pórtico, um cãozinho triste interrompe o seu sono, levanta a cabeça e fita-me. É um triste cãozinho doente, com todo o corpo ferido; gastas, as mechas brancas do pêlo; o olhar dorido e profundo, com esse lustro de lágrima que há nos olhos das pessoas muito idosas.
Com um grande esforço, acaba de levantar-se. Eu não lhe digo nada; não faço nenhum gesto. Envergonha-me haver interrompido o seu sono. Se ele estava feliz ali, eu não devia ter chegado. Já que lhe faltavam tantas coisas, que ao menos dormisse: também os animais devem esquecer, enquanto dormem… Ele, porém, levantava-se e olhava-me. Levantava-se com a dificuldade dos enfermos graves, acomodando as patas da frente, o resto do corpo, sempre com os olhos em mim, como à espera de uma palavra ou de um gesto. Mas eu não o queria vexar nem oprimir.
Gostaria de ocupar-me dele: chamar alguém, pedir-lhe que o examinasse, que receitasse, encaminhá-lo para um tratamento… Mas tudo é longe, meu Deus, tudo é tão longe. E era preciso passar. E ele estava na minha frente, inábil, como envergonhado de se achar tão sujo e doente, com o envelhecido olhar numa espécie de súplica.
Até o fim da vida guardarei seu olhar no meu coração. Até o fim da vida sentirei esta humana infelicidade de nem sempre poder socorrer, neste complexo mundo dos homens. Então, o triste cãozinho reuniu todas as suas forças, atravessou o patamar, sem nenhuma dúvida sobre o caminho, como se fosse um visitante habitual, e começou a descer as escadas e as suas rampas, com as plantas em flor de cada lado, as borboletas incertas, salpicos de luz no granito, até o limiar da entrada. Passou por entre as grades do portão, prosseguiu para o lado esquerdo, desapareceu.
Ele ia descendo como um velhinho andrajoso, esfarrapado, de cabeça baixa, sem firmeza e sem destino. Era, no entanto, uma forma de vida. Uma criatura deste mundo de criaturas inumeráveis. Esteve ao meu alcance, talvez tivesse fome e sede: e eu nada fiz por ele; amei-o, apenas, com uma caridade inútil, sem qualquer expressão concreta. Deixei-o partir, assim, humilhado, e tão digno, no entanto; como alguém que respeitosamente pede desculpas de ter ocupado um lugar que não era o seu.
Depois pensei que nós todos somos, um dia, esse cãozinho triste, à sombra de uma porta. E há o dono da casa e a escada que descemos, e a dignidade final da solidão.

Comentário


Cecília Meireles não foi apenas uma grande poeta, ela também foi magnífica em suas crônicas, todas escritas com extraordinária leveza, suave emoção e intensa poeticidade e, muitas vezes, confundidas com um conto. Vale lembrar que a crônica, nos dias atuais, possui uma forma de expressão bem particularizada, com características próprias que a tornam distinta e inconfundível com o conto. Este é pura ficção, a crônica não o é, sua gênese radica na realidade concreta. 
Ela goza de prestígio no panorama da literatura, notadamente no Brasil, onde muitos cronistas-escritores notabilizaram-se pela qualidade impar dos seus textos: Machado de Assis, Olavo Bilac, Humberto de Campos, Raquel de Queirós, Cecília Meireles, Manuel Bandeira, Carlos Drummond de Andrade, Rubens Braga, Paulo Mendes, Paulo Francis, Érico Veríssimo e tantos outros, integram a galeria dos grandes cronistas brasileiros. Todos cultivaram ou cultivam a crônica com assiduidade.
Eu amo as crônicas, especialmente por sua brevidade e por se reportarem a fatos do cotidiano, a alguma experiência do autor, a algo que ele captou nas ruas, nas pessoas, etc. Dentre ao autores de minha preferência, escolhi Cecília Meireles, autora de um dos textos que mais aprecio por sua poeticidade, pela sensibilidade como ela percebe a realidade que a rodeia e pela reflexão que faz acerca da relação entre humanos e animais: Um cão apenas.

Um cão apenas descreve um encontro casual da autora com um pequeno cão sujo e doente que dormia à sombra de uma porta. Desse fato corriqueiro, a cronista faz um tocante relato acerca da miséria, do abandono e da solidão em que vive o animalzinho, vítima da indiferença das pessoas e da omissão dela própria, que nada fez para ajudá-lo, apesar do olhar de súplica que a pequena criatura lhe lançou. Consciente de sua omissão e já com o peso da culpa a pesar-lhe na consciência, ela diz: “Até o fim da vida guardarei seu olhar no meu coração. Até o fim da vida sentirei esta humana infelicidade de nem sempre poder socorrer, neste complexo mundo dos homens”.
Vale observar a elaboração do cenário em que se desenrola a história do encontro entre a autora e o pequeno cão, notadamente o subir e descer os quarenta degraus da escada da praça: “Subido, de ânimo leve e descançado passo, os quarenta degraus do jardim – plantas em flor, de cada lado; borboletas incertas; salpicos de luz no granito -, eis-me no patamar.” Este cenário primaveril é retomado no quarto parágrafo, significando que a ação de desenrola no mesmo cenário indiferente, alheio: os mesmos elementos do ambiente rodeiam a autora que sobe “de ânimo leve e descansado passo” e o triste cãozinho que desce “como um velhinho maltrapilho, cansado, de cabeça baixa, sem firmeza e sem destino”.
A mensagem da crônica ultrapassa a tragédia do pequeno cão, estendendo-se às muitas tragédias humanas de pessoas, inclusive crianças e velhos, que vivem no mesmo abandono, especialmente nas grandes cidades. Passamos por eles, apressados, com o olho no relógio, sempre com algo mais importante e mais urgente para fazer, por vezes até nos vem um impulso para socorrê-los, mas não o fazemos por vários motivos que damos a nós mesmos, para aliviar a consciência.
Em alguns casos, só mais tarde, volta-nos à memória a lembrança daquele ser humano deitado encolhido no canto da parede, pálido, trêmulo, visivelmente doente, faminto e desamparado. Podíamos tê-lo socorrido e não o fizemos, ninguém o fez, todos indiferentes e apressados, sem tempo “para perder” com um pobre mendigo anônimo.  Afinal, em nossa sociedade materialista, não se costuma olhar para quem não vale a pena. A maioria é omissa sem remorsos, com pessoas e com cães desvalidos.
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Por Zenóbia Collares Moreira Cunha


1 de dezembro de 2010

Reminisção, conto de Guimarães Rosa

Vai-se falar da vida de um homem; de cuja morte, portanto. Romão – esposo de Nhemaria, mais propriamente a Drá, dita também a Pintaxa – impar o par, uma e outro de extraordem. Escolheram-se, no Cunhãberá, destinado lugar, onde o mal universal cochila e dá o céu um azul do qual emergir a Virgem. Sua história recordada foi longa: de tigela e meia a peso de horror. O fundo, todavia, de consolo. Esse é um amor que tem assunto. Mas o assunto enriquecido – como do amarelo extraem-se idéias sem matéria. São casos de caipira.
Foi desde. Parece até que iam odiar-se, moço e moça, no então. Divulgue-se a Drá: cor de folha seca escura, estafermiça, abexigada, feia feito fritura queimada, ximbé- - ximbeva; primeiro sinisga de magra, depois gorda de odre, sempre própria a figura do feio fora-da-lei. Medonha e má; não enganava pela cara. Olhar muito para uma ponta de faca, faz mal. Dizia-se: - “Indicada.”

Romão, hem, gostou dela, audaz descobridor. Pois – por querer também os avessos, conforme quem aceita e não confere? Inexplica-o a natureza, em seus efeitos e variados objetos; ou como o principal de qualquer pergunta nela quase nunca se contém. Romão, meão, condiçoado, normalote, pudesse achar negócio melhor. Mas ele tinha em si uma certa matemática.E há os súditos, encobertos acontecimentos, dentro da gente.

De namoro e noivado, soube-se pouco. Também da sem-graça cerimônia ou maneira, de que se casaram, padrinhos Iô Evo e Iá Ó e quiçá os de Romão e Drá anjos entes. Àquilo o povo assistiu com condolência? Tais vezes, a gente ao alheio se acomoda – preto no branco, café na xícara. Cunhãberá via-os não via, sem pensar em poder entender: anotava-os.
Mas o casal morou na Rua-dos-Altos, onde o Romão estava bom sapateiro. Para fora, deviam de ser moderados habitantes. Era um silêncio quase calado. Comparem-se: o vagalume, sua luzinha química; fatos misteriosos – a garça e o ninho por ela feito. Iam, consortes, para os anos que tendo de passar.
Se como o nem faro e cão – mas num estado de não e sim, rodavam tantas voltas – juntos. Pois. A Drá contra a ocasião de querer-bem se tapava, cobreando pelos cabelos, nas mãos um pedaço de pedra. Ela não perdoava a Deus. – “Padece o que é...” – deduzia Iá Ó. Da dor de feiúra, de partir espelho. Iô Evo disse: que tomava culpa, de ter testemunhado.
Romão, hem, se botava de nada? Não o deixava ela, enxerente, trabalhar nem lazer; ralhava a brados surdos; afugentou os da sua amizade. Romão amava. Decerto ela também, se sabe hoje, segundo a luz de todos e as sombras individuais. O estudo do mundo.
Todo o tempo o atanazava, demais de cenhosa, caveirosa, dele, aquela mulher mandibular. Vês tu, ou vê você? Romão punha-lhe devoção, com pelejos de poeta, ou coisa ou outra, um gozar sentido e aprendido, preciso, sincero como o alecrim.
Tinhava-se, a Drá. Seus filhos não quiseram nascer. Romão imutava-se coitado. Disso ninguém dava razão: o atamento, o fusco de sua tanta cegurira? Sapateiro sempre sabe. Ou num fundo guardasse memória pré-antiquíssima. Tudo vem a outro tempo. 
Então, quando deles no diário ninguém mais se espantava, de vez, houve. Sortiu-se a Drá, o diabo às artes. Égua aluada, e com formigas no umbigo.Em malefaturas, se perdeu, por outro, homem vindico, mais moço.O povo, vendo, condenava-a; de pena do Romão – a tragar borras. Ele, não, a quem o caso de mais perto tocava. E a Iô Evo disse: que bom era ela crer, que valia, que dela gostavam... Romão olhava em ponto, pisava curto, tinham receio de sua responsabilidade.
Nem o moço de fora a quis mais. Desrazoável, mesmo assim, a Drá de casa se sumiu, com seus dentes de morder. Romão esperou, sem prazo. Se esforçava, nesse eixar-se, trincafiava, batia sola. Seguro que, por meio de Iá Ò, pedu que ela tornasse.
Drá voltou, empeçonhada, trombuda, feia como os trovões da montanha. Romão respeitava-a, sem ralar-se nem mazelar-se, trocando pesares por prazeres, fazendo-lhe muita fidelidade. Fez-lhe muita festa. De por aí, embora, seresma ela se aquietou, em desleixo e relaxo. Nem fazia nada, de cabeça que dói. Só empestava. Vivia e gemia - paralelamente. Chamou-a então Pintaxa o bufo do povo.
Foi, e teve ela uma grande doença. Real.de que escapou pelo Romão, com seus carinhos e tratos. Sarou e engordou, desestragadamente, saco de carnes e banhas, caindo-lhe os cabelos da cabeça, nos beiços criado grosso buço, de quase barba. Era bem a Pintaxa, a esta só consideração. Cunhãberá jurou-a por castigada. Romão queria vê-la chupar laranjas, trivial, e se enfeitar sem ira nem desgosto. Ele envelhecia também. Os dois, à tarde, passeavam. Quem espera, está vivendo.
Depois, ele se enfermou, à-toa, de mal de não matar. A Drá alvoroçou o lugar. Ela chorava, adolorada: teve de emsi, notícia, das que não se dão. Pediu socorro.
O povo e o padre no quarto, o Romão onde se prostrava, decente, chocho, em afogo, na cama. Ele estava tão cansado;buscava a Drá com os olhos. Que quis falar, quis, pôde é que foi não. Iá Ó passava um lenço, limpava~lhe a cara, a boca. Iô Evo mandou-o ter coragem, somente.
Dando-se, no Cunhãberá, o fato, de inaudimento.
Romão por derradeiro se soergueu, olhou e viu e sorriu, o sorriso mais verossímil. Os outros, otusos, imaginânimes, com olhos emprestados viam também, pedacinho de instante: o esboçoso, vislumbrança ou transparecência, o aflato! Da Drá, num estalar de claridade, nela se assumia toda a luminosidade, alva belíssima, futuramente... o rosto de Nhemaria.
Romão dormido caiu, digo, hem, inteiro como um triângulo, rompido das amarras. Ele era a morte rodeada de ilhas por todos os lados. Mentiu que morreu. Deu tudo por tudo.
A Drá esperançada se abraçou com o quente cadáver, se afinava, chorando pela vida inteira. Todo fim é exato. Só ficaram as flores.



Comentário do conto "Reminisção", de G. Rosa


Reminisção é um dos contos da coletânea Tutaméia – terceiras estórias (1967. Talvez seja o que mais possibilita a identificação de algumas das diretrizes que norteiam o fazer literário de Guimarães Rosa, implícitas nos seus quatro prefácios, todos eles constituídos como reflexões veiculadoras da teoria literária pessoal e particularíssima do autor, perceptíveis numa leitura atenta das linhas e entrelinhas de cada um deles. 
Em uma primeira leitura, “Reminisção” parece ser apenas a narrativa de uma estranha e inusitada história de amor, vivenciada por Romão e Drá, em uma cidadezinha sertaneja. Mas, há outras leituras possíveis do conto que remetem para questões de ordem teóricas, pois, nele, Guimarães Rosa instaura uma realidade que rompe com os sistemas racionais do pensamento para a apreensão do real, substituídos por outro pautado em sua visão particularizada e pessoal sobre os fatos ficcionalizados. Trata-se de um posicionamento do autor contrário à supremacia da Razão, esquivo ao primado do método racional como único e superior caminho para a apreensão do real. Guimarães Rosa privilegia outras escolhas, como a intuição, a revelação, a inspiração, para fugir ao dogmatismo da inteligência reflexiva e à tirania da razão cartesiana. 
No que respeita à “estória” narrada, temos duas personagens centralizando a trama: Romão, sapateiro, homem tranqüilo, tolerante, devotado, e sua mulher, a Drá, mulher horrenda, má, “feia feito fritura queimada” (p.82) ou “feia como os trovões da montanha”, “empeçonhada”, “trombuda” (p.83) como declara o narrador, que não faz economia dos mais negativos adjetivos e comparações para caracterizar a personagem feminina como a mais peçonhenta, odiosa e execrável dentre todas as mulheres do lugarejo. Romão, que parece cego para as más qualidades e intensa feiúra da criatura, apaixonou-se perdidamente por ela. O seu intenso amor é uma força avassaladora que ignora e supera tudo, feiúra, doença, traição, ignorando, inclusive, as opiniões desfavoráveis da comunidade. Sim, a visão de Romão sobre Drá é bem diversa das visões da comunidade sobre a mesma. Romão consegue transcender à visão da aparência física da mulher, sua feiúra e mau gênio, vislumbrando outra realidade que subverte a verdade visível e observável, substituindo-a por uma realidade oposta. 
Os olhos do homem parecem não enxergar a ostensiva feiúra e a exacerbada maldade da mulher, dando a impressão de que só são capazes de ver alguma coisa escondida atrás das aparências, alguma coisa misteriosa que a comunidade não consegue ver e que unicamente Romão, pode perceber: 

“ Não o deixava ela, enxerente, trabalhar nem lazer; ralhava a brados surdos; afugentou os de sua amizade. Romão amava. Decerto ela também [...]. Todo o tempo o atazanava. Demais de cenhosa. Caveirosa, dele, aquela mulher mandibular. Vês tu, ou vê você? Romão punha-lhe devoção, com pelejos de poeta, ou coisa ou outra, um gostar sentido e aprendido, preciso, sincero como o alecrim. [...] Disso ninguém dava razão: o atamento, o fusco de sua tanta cegueira? Sapateiro sempre sabe. Ou num fundo guardasse memória pré-antiqüíssima. Tudo vem a outro tempo (p. 82)”. (grifos nossos) 

A frase grifada e o próprio título do conto justificam uma leitura do conto à luz da teoria do “amor platônico”, e da noção de “reminiscência” de Platão, filósofo cuja obra era uma grande preferência de leitura do autor. 
É evidente que Romão, não está de acordo com a forma como a comunidade vê sua mulher. Segundo a sua particular visão, Drá é belíssima. Romão não tem dela uma visão física, oriunda dos seus olhos, mas sim uma visão de outra ordem, quiçá vinda das camadas profundas do seu inconsciente, dotadas de poderes de visualizar, sob o véu das aparências, para além do físico de Drá, uma beleza sublime, transcendente, acessível apenas aos seus olhos. 
No final do conto, quando Romão adoece, já prostrado no leito de morte, Drá aparece a seus olhos em sua forma verdadeira, em sua essência: 

"Romão por derradeiro se soergueu, olhou e viu e sorriu, o sorriso mais verossímil. Os outros, otusos, imaginânimes, com olhos emprestados viam também, pedacinho de
instante: o esboçoso, vislumbrança ou transparecência, o aflato! Da Drá, num estalar de claridade, nela se assumia toda luminosidade, alva, belíssima, futuramente... o rosto de Nhemaria." (p. 84) 

Como o narrador afirma, Romão guardava em si “memória préantiquíssima” (p. 84) – ou seja, supõe-se que a essência de Drá, sua natureza Nhemaria, em conformidade com a teoria do amor platônico, está decalcada, indelevelmente, na alma de Romão, desde tempos e realidades anteriores, vivenciadas por ambos. Assim, de acordo com a teoria platônica da reminiscência, Romão ama porque se lembra com os olhos da alma, e ama com tanta intensidade porque rememora, porque guarda em sua alma a lembrança da face original de Drá. A teoria platônica da reminiscência afirma que, quando a alma desencarna, retoma o conhecimento direto das Idéias, esquecido ao reencarnar. Todavia, tal conhecimento permanece, de forma latente, interiorizada na alma reencarnada. Isto significa que o conhecimento consiste em trazer à consciência, por meio de algum estímulo, as reminiscências interiorizadas. 
Observe-se, no final da narrativa, o momento mágico da epifania, no qual as pessoas presentes no quarto também visualizam momentaneamente a transformação da terrificante Drá na belíssima e etérea Nhemaria. Visualizam “com olhos emprestados” (p. 83), ou seja: por meio da palavra escrita do autor, modificando, metamorfoseando e recriando a realidade em conformidade com a sua concepção da vida, do homem e do mundo. Neste caso, as pessoas da comunidade que conseguem visualizar a transfiguração de Drá em Nhemaria, metaforizam os leitores que conseguem captar o sentido sotoposto do texto, apreendendo o que ultrapassa à compreensão racional do senso comum, o que transcende o sentido manifesto do texto.